O ano de 2021 mal começou e dois artigos científicos desenvolvidos no Rio São João foram publicados em periódicos internacionais, de reconhecida relevância na área das invasões biológicas e do conhecimento popular como aliado da conservação (Biological Invasions e Ethnobiology and Conservation). A primeira autora de ambos é Paula Araujo Catelani (foto, abaixo), a primeira Doutora egressa do Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais e Conservação.

Em abril de 2018, Paula defendeu a tese “Biologia da espécie não nativa Cichla kelberi Kullander & Ferreira, 2006 (Teleostei, Cichlidae) em um rio costeiro e sua interação com a ictiofauna nativa”, sob a orientação da Profa. Ana Cristina Petry (NUPEM/UFRJ) e co-orientação do Prof. Fernando Mayer Pelicice (NEAMB/UFT). Os artigos recentemente publicados são produtos da tese e revelam que o sucesso da invasão do tucunaré no estuário do Rio São João se deve ao desempenho desse voraz predador visual e ao apreço que ele desperta em pescadores esportivos.

Para compreender melhor essa história, precisamos retornar 40 anos. O soerguimento de uma barragem numa área baixa e plana, onde diversos rios menores convergiam para a calha do Rio São João transformou a lagoa de Juturnaíba no reservatório homônimo. Em seus primeiros anos, o reservatório apresentava fartura de peixes nativos. Piaus, traíras, acarás, piabas e principalmente sairus eram semanalmente despachados aos mercados de Campos dos Goytacazes pela estrada de ferro. Aos finais de semana, as margens do reservatório eram ocupadas por famílias que faziam daquele, um local de lazer e pescaria a baixo custo. Mas os alevinos de tucunarés introduzidos na década de 1990 por pescadores esportivos rapidamente proliferaram em Juturnaíba. Atualmente, existem populações estabelecidas de tucunarés tanto na represa como a jusante, no estuário. Apesar de originários da Bacia Amazônica, no Rio São João os tucunarés chegam a ser capturados a poucas centenas de metros da foz, onde a água é salobra.

Pescadores artesanais, que são os mais antigos na região e que guardam na memória o resultado de suas pescarias do passado, reconhecem o empobrecimento no número de espécies de peixes em Juturnaíba, após a invasão dos tucunarés. Porém, esse peixe se transformou na principal fonte de renda para muitos desses pescadores. A tolerância à salinidade e a valoração na pesca representam verdadeiros desafios na mitigação dos efeitos catastróficos que o tucunaré ainda pode causar no emblemático Rio São João, que é a fonte de água doce para a Região dos Lagos e colírio para os olhos de quem se aventura por suas águas.

UFRJ PPGCIAC - Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais e Conservação
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