O edital do Programa Doutorado Sanduiche no Exterior (PDSE) está aberto, com novas oportunidades para alunos do PPG-CiAC desenvolverem parte de suas pesquisas em qualquer lugar do mundo. Ao mesmo tempo, recentemente tivemos o retorno de dois alunos que participaram da edição do PDSE 2016.

Um desses alunos, Hudson Lemos, que é bolsista CAPES e desenvolve o projeto “Ecologia Molecular de pequenos mamíferos para avaliação da fragmentação na Mata Atlântica” sob a orientação do Prof. Pablo Gonçalves Rodrigues, conta que sua experiência foi além do desenvolvimento de pesquisa, mas uma real imersão em um sistema acadêmico bem estruturado e diverso.

 

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Peromyscus sp. capturado em armadilhas de captura viva gênero bastante investigado em estudos evolutivos

 

De acordo com Hudson, “não é novidade que programas de estágio no exterior podem configurar a primeira oportunidade que um profissional possui de sair do seu país de origem e mergulhar numa experiência profissional e cultural. Comigo não foi diferente. Durante cinco meses que passei nos EUA observei a efetividade com a qual os processos de pesquisa, extensão e ensino são desenvolvidos naquele país. O interessante é que a própria CAPES deixa claro, nos editais do PDSE, que um dos objetivos dessa linha de fomento é estimular o desenvolvimento de pesquisa em instituições de ponta, e também apresentar novos pontos de vista para os jovens profissionais.

Cheguei ao Williams College (Williamstown, Massachusetts), em 14 de abril de 2017, poucos dias após o término do inverno. A paisagem era completamente diferente de qualquer outra que eu já havia visto. Nessa época, a avifauna era basicamente composta por corvos voando entre as árvores ainda desfolhadas do campus.

Minha co-orientadora no Williams College, Dra. Luana Maroja, encaminhou-me ao setor de alunos estrangeiros e à polícia do campus, e imediatamente foi confeccionado um cartão eletrônico que me daria acesso aos diferentes prédios, com suas bibliotecas e laboratórios. Apresentou-me também o calendário acadêmico da instituição, que fica integralmente disponível on-line. Percebi que não me faltariam distrações nos momentos livres.

Então, um dia após minha chegada, já estava eu caminhando pelas florestas temperadas do leste americano para conhecer uma atividade de extensão. A atividade seria realizada dentro dos limites da Hopkins Memorial Forest (HMF), que possui 1040ha de mata administrada pela Williams College Center for Environmental Studies (CES) e está distribuída pelos estados de Massachusetts, New York e Vermont. Ali é o cenário de diversas atividades de extensão realizadas pela universidade.

Tal atividade era aberta a qualquer pessoa que tivesse interesse, e na ocasião foi guiada por um herpetólogo local. Ok, não vi cobras ou lagartos, mas não me faltaram salamandras! O roteiro da atividade focava em mostrar como as espécies de salamandras eram específicas para cada tipo de habitat. As crianças adoraram competir por quem coletaria o maior número de salamandras e qual seria a mais peculiar. E ao final, a diversão foi colocá-las em liberdade novamente. Também conheci o chefe da HMF, que me apresentou diversos projetos de monitoramento e reflorestamento que vêm sendo executados há mais de cem anos!

O sistema de seleção de alunos realizado pelo Williams College despertou-me bastante interesse. Ele é diferente do sistema brasileiro, que valoriza alunos que colecionaram mais conteúdo ao longo do ensino básico. Aí está talvez a chave da diversidade que observei dentro da universidade americana. Lá, não são somente boas notas que determinam a entrada na faculdade. Os alunos também são valorizados em outros quesitos, e podem conseguir suas vagas por terem desenvolvido qualidades notáveis em outros aspectos, como no esporte, artes ou inserção social (muitos participavam de trabalhos voluntários antes de entrar na faculdade).

E por falar em esportes, a maioria dos alunos e professores praticavam pelo menos algum esporte nas próprias instalações da universidade. Aos domingos era bem comum ver os gramados do campus sendo ocupados por diversos tipos de modalidades esportivas e recreativas.

Ok, voltando para o crescimento intelectual...o Center for Environmental Studies possui encontros semanais em um restaurante do campus, o ‘Log Lunch’, onde dezenas de pessoas primeiro almoçavam descontraidamente algo preparado pelos próprios alunos (cada semana uma novidade gastronômica), e depois assistiam palestras de integrantes renomados das causas ambientais. Tive a oportunidade de assistir palestras de diversos pesquisadores, além do líder do 350.org, Bill McKibben, que em 2014 ganhou o “Right Livelihood Prize”, e também do senador Benjamin Brackett Downing, especialista em urbanismo e políticas ambientais, envolvido na discussão do papel do estado na manutenção dos níveis de carbono atmosférico.

Sobre ensino, assisti às aulas de Evolução da Dra. Maroja. A metodologia de ensino é bem diferente da utilizada na maioria dos cursos de Graduação do Brasil. Havia três encontros por semana, cada um com duração de apenas 1 hora. Às segundas e sextas-feiras aconteciam discussões de artigos científicos, que já estavam disponíveis no sistema on-line desde o início do período. O conteúdo era apresentado somente às quartas-feiras, e me chamava atenção, ocasionalmente, ocorrer curtas pausas durante a aula para realização de enquetes sobre o assunto corrente.

Nessa situação, os alunos passam pouco tempo dentro da sala de aula, porém desenvolvem muitas práticas em laboratório, e escrevem, constantemente, relatórios e trabalhos. Além disso, os professores possuem horas disponíveis em seus gabinetes para que os alunos possam discutir temas relacionados à disciplina ou aos projetos pessoais que envolvam as teorias de responsabilidade desse professor. E os alunos realmente utilizam isso!

Vale lembrar que a avaliação semestral do processo educativo adotado pelo professor é padronizada na instituição há mais de 100 anos. Assim, os professores já têm um bom “pontapé inicial” para melhorar suas aulas a cada semestre.

Outra diferença que achei interessante quando comparado ao sistema encontrado na maior parte das Universidades brasileiras é que nos EUA os alunos não escolhem o diploma que terão no momento do vestibular. Eles possuem dois anos, já dentro da universidade, para decidir qual será sua profissão (e você pode ter até dois diplomas, ex. “Biólogo” e “Estatístico”). As disciplinas artísticas são bem frequentadas no inicio da faculdade, pois são aconselhadas em todas as áreas por aperfeiçoar oratória e expressão corporal. Por consequência, vários alunos apresentam recitais oferecendo uma gama enorme de eventos musicais no campus. Tive oportunidade de assistir apresentações de estilos musicais de diferentes lugares do mundo.

Em relação à pesquisa que executei, minha Tese procura investigar os efeitos da fragmentação florestal no fluxo e diversidade genética de populações de duas espécies de pequenos mamíferos. Minha co-orientadora estrangeira desenvolveu alguns dos “primers” moleculares que eu usaria nesse trabalho, e rotineiramente trabalha com as técnicas necessárias para o meu estudo. Isso determinou nossa escolha quando estávamos buscando uma boa parceria para o desenvolvimento de meu estudo fora do país. Durante meu estágio no Exterior, processei cerca de 300 amostras de forma relativamente rápida se comparado ao tempo que gastaria no Brasil. A parte final do processo laboratorial (genotipagem) é comumente realizada em laboratórios privados, que fazem isso em larga escala. Nos EUA algumas facilidades aceleram o processo. Por exemplo, o recolhimento de amostras é diário na própria instituição, não sendo necessário agendamento como acontece no NUPEM/UFRJ, por exemplo. O serviço de postagem funciona muito bem, em uma noite minhas amostras chegavam a outro Estado americano, por exemplo. O laboratório privado também era bem eficiente, em apenas uma manhã as amostras eram processadas. Sendo assim, tive tempo de rever e refazer eventuais falhas da genotipagem, algo que foi muito importante para o andamento de meu projeto.

Além disso, no Williams College tive contato com técnicas laboratoriais básicas que são alternativas às usadas aqui, que certamente poderei adotar ou mesclar com as que utilizo no Brasil. Os resultados gerados ainda no inicio desse período fundamentaram uma apresentação de pôster no Evolution Meeting 2017 em Portland - OR, organizado pela Society for the Study of Evolution. Sim, cruzei os EUA, de leste a oeste! Esse foi um evento balizador para mim. Entre as novidades apresentadas, havia um aplicativo com diversas funcionalidades, como a possibilidade de convidar cinco participantes para visitar seu trabalho, e marcar encontros entre jovens candidatos a pós-graduaçao e orientadores. A festa de encerramento aconteceu no Oregon Zoo, cenário ideal para biólogos. Além do congresso, a visita à costa oeste me rendeu uma trip por florestas que muito se opõem às da costa leste, e também me propiciou a primeira visita no oceano Pacífico, na bela Cannon Beach.

Nos últimos tempos de meu estágio no exterior, aquela paisagem invernal que me recebeu quando cheguei havia se transformado em um ambiente repleto de verde. A avifauna do campus estava muitíssimo mais diversa. Além disso, os queridos mamíferos apareceram, e frequentavam a pequena Williamstown como cidadãos comuns. O tempo todo via coelhos, veados, marmotas e diversas espécies de esquilos convivendo pacificamente no campus. Sem contar meu registro mais emocionante... ...um urso negro (Ursus americanus) bem pertinho da minha moradia!

Bem, meu relato poderia ser muito mais longo. Certamente são muitas histórias e experiências. Foram cinco meses que pareceram muito mais que isso. O que concluo de toda minha experiência é que um intercambio no exterior é estrategicamente importante tanto para o indivíduo que vai, quanto para todo o sistema acadêmico que aqui fica. Ideias sem fronteiras são essenciais na ciência para que não percamos tempo “reinventando a roda”.

Como tradição do PDSE, os ex-bolsistas estão sempre dispostos a ajudar os futuros bolsistas. Deixo aqui minha disposição para atender os futuros candidatos. Afinal, para mim, a parte mais difícil da viagem foi sem dúvida ainda no Brasil, quando tive que reunir os documentos e preencher os formulários da seleção interna, da CAPES e do Visto. Mas valeu todo o esforço!”

 

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UFRJ PPGCIAC - Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais e Conservação
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